quinta-feira, 16 de abril de 2015

Flash Urbano n.10 - 1973

    Sua salvação era o sexo dos pombos. Desde que tinha sido preso no DOI-CODI devido a suas posições políticas -Um militar comunista, onde já se viu?-, observar os pombos pela janela era o que mantinha suas sanidade. As suas sessões de tortura que lehe eram reservadas eram mais de natureza psicológica. Hinos militares a volumes ensurdecedores, temperaturas gélidas alternando com o bafo do inferno. A privação do sono começa a fazer efeitos alucinatórios a partir do terceiro dia. Mas havia a janela da qual se via um pátio onde se reuniam pombos. A corte do pombo era um ritual previsível mas com pequenas variações. O pombo seguia a pomba onde quer que ela fosse. Ela voava para a chaminé, lá ia ele atrás. Se ela descia imediatamente após a chegada dele, não havia problema. Não havia protestos, não havia muxuxo. Os pombos seguiam sua programação genética com a inexpressividade de um peixe. Mas havia o movimento frenético do pescoço para frente e para trás. Parecia que estava de alguma forma associado ao movimento das patas. A corte podia durar até dez minutos em média. Eis que, de repente, a pomba resolve continuar onde estava, mesmo com a chegada do pretendente. Sutilmente dava as costas para este, de ladinho. Ele, prontamente a montava e fazia o que tinha de fazer. A cópula durava não passava de ridículos dois segundos. O lance era a corte.
     Quando a temperatura começava a baixar, ele começava a pular. Polichinelos eram familiares. Ele podia imaginar que era um cabo siberiano. A observação dos pombos era melhor quando o clima da sala estava mais quente. Quanto menos movimento, melhor. Difícil era vê-los voando. Invejava com todas suas forças a estupidez dos pombos. Eles podiam voar.

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